domingo, 25 de maio de 2014

João Rosa de Castro - Flores do Pântano

O LUTO ACABOU?

Fora deste raio de visão,
Tudo acontece.

Ser dócil sem ser femínio.
Ser útil sem ser o estorvo.
Solidão sem lamento.
Andar na areia sem deixar pegadas.
Não crer em grandes multidões.
Distinguir o pensamento puramente seu.

Tudo é possível
Quando não choramos pelos que partem.
A dor do luto,
A flor do lodo,
O calor que sufoca.

O que dizer, vida, da vida?
O que pensar, vida, da morte?

A saudade aquece
As lágrimas que caem.
A saudade é um fato,
Não só um sentimento.
A saudade é a ausência
De uma voz alada,
De um olhar amado,
De um sorrir cantando,
Um conversar dançando –
Parado, exangue.

Fora deste raio de visão,
Tudo entontece.
Aqui, estou atento,
Olhando as horas,
Que a cada minuto
Me afastam

Dos que amei.

domingo, 18 de maio de 2014

João Rosa de Castro - Flores do Pântano

ENTRE MIM E A LUA

Já é noite.
Os amigos conversam no bar.
A lua luta contra as nuvens
Para aparecer.

Já é noite.
A Sol revela um segredo
Que pede a solução de um problema.
Mais um crime está por ser praticado:
Separação.

Os amigos do bar sempre aconselham o que é mais fácil.
E a Sol não quer ouvir conselhos difíceis.
Quer, no máximo, adiar a última transa
Com tudo certo na cabeça.

Ocorre que entre eles,
Os amigos se descobrem:
Um parece covarde,
O outro um traidor ingênuo
E o terceiro não está muito presente,
Fica atento e ligado no que são os homens.
Anota tudo para os extra-terrestres.

Os homens, as nuvens, a Sol
Querem apenas uma coisa na noite –

Ofuscar a beleza da lua.

domingo, 11 de maio de 2014

João Rosa de Castro - Flores do Pântano

O VENTILADOR SEM RUÍDO

Meu pensamento gerou uma tempestade
Que destruiu antenas parabólicas,
Desbastou telhados,
Descurou favelas.
Não sei o que fazer com minhas cenas.
Todo o cinema é pouco
Para mostrar tudo o que sinto,
Esquadrinhar tudo o que penso.
Meu pedido de socorro
Sai do meu peito num idioma
Que não é falado por ninguém.

domingo, 4 de maio de 2014

João Rosa de Castro - Flores do Pântano

MADMOSAILLE MOLLAMBÔ

Maria Molambo de olhares firmes.
O escarlate desses seus rubis
É que dá o róseo dos bares mais brancos,
Eu levei um susto quando a conheci.
Imaginavas-te uma pura inerme.
Uma gorda feia com manchas no rosto.
Marcada toda pro deus insolente
Não perder de vista a sua alma fétida.
E no entretanto a tua beleza
Torna pura e bela a maior fealdade.
Se até Shopenhauer a houvesse encontrado
Em Alemanha, em França, em algures
Seria pai a filhos primorosos
E viveria além da primavera
Que tornas negros os rostos sem cores,
Que tornas finos os gestos mais rudes
Que fazes melífluo o mais amargo cálice.
Mas inda arranhas com unhas profundas
As mesmas que embelezam a tua taça,
As costas de Narcisos insensatos
E perfumando as escadarias
Com seu vestido colado à cintura
Com seu enigma calado no tempo.
Os Gitiranas amanhecem homens
Os favelados em orgasmo somem
Da atmosfera e chegam ao sol,
Que a tua beleza me ensina a enxergar

O belo microscópico da vida.

João Rosa de Castro - Despedida - Encerramento do Blogue Lume d'Arena

Prezado leitor. É com imensa satisfação que venho expressar minha gratidão a todos que visitaram, leram, compartilharam e acompanharam o L...