A
REINVENÇÃO DO VENTO
As noites sem sono
Dão sono de dia.
Você abre o livro
Pros moços passarem.
O vento na sua mão é chave,
O verbo na sua língua – suave.
Pega no fundo a cor parda.
Peca na lateral da tela.
As cidades com o tempo se apequenam.
E as multidões minimizam:
Maquetes que vês ao longe.
A sua palavra se avoluma.
Você se tornou gigante.
Na companhia segura do poeta Léo de Carvalho,
tiveram início os meus movimentos literários até aqui. Movimentos que, mesmo em direções diferentes, tiveram algo em comum: a escrita de trinta e um livros, sendo eles dezesseis
em verso e quinze em prosa.
O primeiro movimento foi ouvir o poeta lendo sua
poesia profunda, vibrante e vivaz, repleta de signos do amor e da paixão,
resultados da opressão ferrenha da ditadura militar, que forçava as pessoas a
uma felicidade que apenas era desmistificada (ou até vivida) através da poesia.
Eu precisava daquilo: do contrário me evadia aos tentáculos da “normalidade”,
onde era importante permanecer. Uma adolescência um tanto singular havia me perturbado.
O segundo movimento foi recolher aquelas centenas
de poemas do amigo e transcrevê-los em textos que eu datilografava;
aproveitando para aperfeiçoar a gramática, pois, ao que parecia, eu tendia para
as normas padrões.
Foi no apart-hotel Saint Peter, na Alameda Lorena, nos
Jardins, que, depois de tanto ouvir e ler poesia, a minha própria se iniciou.
Começava então o terceiro movimento: escrever a própria poesia.
O quarto movimento foi, depois de ter diluído em
água, sete anos de poesia, recomeçar, com a ajuda da psicanálise, a escrever.
Desta vez tomando todo o cuidado para não perder nem mesmo o esboço de um
poema, registrando todos os livros na Fundação Biblioteca Nacional.
O quinto movimento foi produzir os demais livros em
prosa. O sexto movimento está sendo traduzi-los. O sétimo, publicar cada um. O oitavo
movimento, incluir cada um nos prêmios que surgirem, etc., etc., etc. Escrever
não tem fim.
O seu autor,
João
Rosa de Castro.