A
VIDA É NOSSA
A tribo não dançou hoje como ontem.
Quer ver televisão com as meninas.
Do teu nariz escorre um ar pesado.
Você engana quantos não enxergam.
Eu com a teia aranha faço laços.
O Pedro com ouvidos de argila.
Fofoca come solto na bastilha.
Um quer sorver o outro pelo nome.
O mundo aprendeu tudo com Dolores.
O que fazer com tudo assim tão pronto?
O que dizer se tudo já vai dito?
O nojo foi virando uma virtude.
A praga, um negócio, uma fortuna.
Que tudo que se diz guarda um segredo.
Tesouro acumulado torna um rico.
O rico pisa sobre o sem segredo.
E o
mundo vai seguindo sem sentido.
Fio Terra poderia ter outro título que este ambíguo. Mas,
como a arte em si é polissêmica, não há porque não chamá-lo assim.
Fala em equilíbrio, em uma esperança que nem
aumenta nem diminui o suplício. Mas uma esperança que move para o ato. Para a
ação, para o sentir-se ativo e agente da própria vida.
Pede, do começo ao fim, e a quem quer que ouça, a
purificação, a cristalização do mundo, a clareza da própria obscuridade, a
purificação do absurdo, e, talvez, o obscurecimento do translúcido, numa
urgência de movimentos que não importa quais sejam, desde que sejam movimentos.
Observa que as paisagens se compõem em si mesmas.
Os rios se encontram e se comunicam, as águas chegam ao mar. O mundo é um só e
estamos todos nele e por ele ligados.
Usa linguagem formal ao lado de gírias, como em:
“Vós coniventes e inversos: nóias ou anjos-da-guarda?”, e a ligação de lugares
distantes, como em “E a Indonésia e a Líbia sopram vulcões da Islândia.”.
É, portanto, livro repleto de movimento e imagens
transcendentais, que me traz muito orgulho ter escrito e teria me deixado menor
se não o tivesse feito.
O seu autor,
João
Rosa de Castro.