MAL NOVO
Surge repentino,
explode no seu pensamento o nome da doença que matou seus heróis: Heterofobia. Heterofobia. Segue-se uma gargalhada: - Heterofobia - Heterofobia.
- Isso não se
confunde, antes se distingue, é misoginia.
- Não, doutora, não.
As mulheres, em si, encantam e satisfazem. Os homens, em si, alegram e saciam.
O problema é quando se unem. O amor é a causa. O ódio ao amor é o primeiro
sintoma
- Mas isso deve ser
inveja do casal.
- Não, doutora, não é
não. Invejar é não querer que o outro seja feliz. Mas os homens e as mulheres
juntos não são felizes. A raiz desse mal novo é a consciência da infelicidade
contagiosa. O risco de se contaminar. O heterófobo
tem arrepios ao ver o casal de mãos dadas, rumo a uma desgraça certa.
- Mas “ele” também existe
a partir dessa relação. Isso parece pulsão de morte. Essa figura sofre antes de
biofobia, que é um mal antigo.
- Mas se os homens se
beijassem, isso entristeceria o biófobo, mas alegraria o heterófobo. A doutora está evadindo à doença nova.
- Não estou. Quero saber
se é nova mesmo ou uma antiga disfarçada em nova. Isso de se alegrar com dois
homens se beijando parece hedonismo, busca de prazer, que também é um impulso
velho.
- Mas, doutora, a
busca do prazer é bem diferente do horror do desprazer. O sujeito pode ser
hedonista e ainda ser indiferente ao mundo hétero. O que não ocorre com o novo
doente, que tem calafrios da idéia do matrimônio.
- Alguma coisa da
infância.
- Deve haver muitas
infâncias parecidas.
- A homofobia existe.
- Então, os heterossexuais
podem ter aversão aos gays com direito a designação e tudo, como dizem:
homofóbico. Agora os gays estão começando a devolver a aversão, numa projeção
que culmina com a vingança: o heterofóbico.
- Mas parece que, por
exemplo, no caso dos homens homossexuais, eles ficariam sem o encanto do
masculino, do viril autêntico, que, de resto os atrai.
- Para o sexo sim.
Mas está surgindo o novo gay, que além da alegria, também quer amar e conviver.
- Se quer amar e
conviver porque não fazê-lo também com os héteros? Percebo um paradoxo nesse
impulso à heterofobia: sobretudo
entre essa perspectiva de querer conviver e a doença em si. Será que essa nova
figura quer se fechar num mundo só gay e nele “amar e conviver”. Entre iguais
isso é muito fácil. Todo mundo se entende, de certa forma.
- Justamente esse
contrassenso me faz chamar isso um grande mal a se tratar.
- É
verdade. Assim como os outros males são tratados, desde a biofobia até a
homofobia, extremos opostos, já que na biofobia temos a aversão à espécie e na
homofobia a aversão à não-espécie: dois homens não procriam. Vamos tratar esse
mal novo.