domingo, 29 de abril de 2018

João Rosa de Castro - Amor Grátis

SOB O CREPÚSCULO

Homem feito, ele reencontra Luciana.
Mais do que sonha
Sai da boca dela,
Emana dos seus gestos.
Despe-se ela da coroa
Que lhe dera a infância.
No negro de sua veste,
Na indiferença de sua voz
Morre um encanto
E surge um glamour novo,
Como se sua alma
Ganhasse nova tez.
Como se se transformasse
No que ele mais queria:
Numa possibilidade,
Num prenúncio de bem-aventurança,
O amor mais vivo que se viva,
Posto que de amantes à parte,
Dado que inocentes não se saibam.
Mais do que ele pede,
Luciana mostra no olhar,
Pela destra marca do seu rosto.
Cada palavra sua
É para ele grande novidade.
O que projeta ele agora
Depois de vê-la só pessoa?
Menos pessoa torná-la
Como se fosse o próprio tempo?
Não, não, Luciana cresce,
Ergue-se numa montanha,
Perde-se em amores efêmeros,
Busca o céu nas alturas,
Tece cada passo do destino,
Não se percebe adorada
Como uma abstração.
Quer a realização própria,
Distância de muletas humanas.
Cresce Luciana sóbria,
Ágil até no sentir
E invicta de paixões ardentes.
O homem feito reencontra Luciana,
Alma perenal do amor mais antigo,
E ajusta a desordem de sua cabeça.
Sabê-la era um fascínio,
Amá-la era um deleite,
Cantá-la uma devoção,
Revê-la foi um delírio.
O homem estagnou
Ficou na sonífera ilha,
Pensando, relendo e sentindo
Os calores do espírito,
O ritmo da memória.
Negou anos de aventuras
Para adorá-la em paz
Agora, porém, o que temos:
Luciana, solitária, amada,
Esse homem, solitário, amante,
O destino a lançar as cartas
E o tempo assistindo a tudo.


POST SCRIPTUM

Este conjunto de aforismos, que teria sido meu primeiro livro em prosa e o último a ser escrito, deve sua existência ao marasmo que me havia reservado o silêncio em resposta a toda a minha poesia.
Escreve-se, afinal, para comunicar-se. Porém, também acredito que serei um autor póstumo, e que também os meus leitores ainda não nasceram.
Este fenômeno tende a ocorrer ou quando a obra é muito boa (e a época muito ruim) ou quando a obra é muito ruim (e a época muito boa)!
Não sei ao certo se este trabalho todo, envolvendo mais de 26 anos de escrita, está nivelado à nossa era ou acima dela. Hoje protestamos contra os governos e as corrupções impunes e nada nos assevera que amanhã protestaremos menos por isso, nem que protestaremos mais ou menos por quer que seja. Nós estamos jovens e nos sentindo velhos. E isto é um sinal de bem-aventurança: uma velhice nacional precipitada.
Que só uma velhice precipitada nos inspira o belo e seguro egoísmo da insatisfação com tudo. Isto também torna humano.
O livro teve tarde de autógrafos, com uma pequena tiragem, no então atelier de pintura, de José Silva de Carvalho, em casa de sua mulher, Aparecida de Alencar Carvalho, que fez reunir os amigos e alguns parentes para um coquetel, em 2006.
Traduzi para o idioma inglês, e Itzel Pérez traduziu, no México, para o espanhol. Atualmente o meu Post Scriptum é divulgado virtualmente pela Babelcube Inc. e seus canais de distribuição, que acolheram ambas as traduções.

O seu autor,

João Rosa de Castro.

João Rosa de Castro - Despedida - Encerramento do Blogue Lume d'Arena

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